|
Selinho da blogagem! |
Puxa, nunca pensei que uma blogagem coletiva proposta tão espontaneamente fosse tomar essa proporção: um momento em que todos na casa dormiam e eu me peguei a olhar uma caixa cheia de imagens que estão misturadas... Porque algumas estão desorganizadas, outras já naqueles álbuns que recebemos na revelação, mas que traziam consigo milhões de significados.
Tinha fotos aos montes, principalmente dos nossos filhos, do início do casamento, de pessoas que já partiram... Eu, canceriana (=saudosista por natureza), me vi emocionada e rapidamente soluçando. Sim, porque eu lembrei de muitas coisas lindas, que valeram a pena ser vividas!
|
Apaixonada por animais |
Tinha meu avô fumando cachimbo e eu fazendo zona ao lado dele, que tentava ler alguma coisa embaixo da parreira da casa dele; o balanço feito com corda do armazém desse mesmo vovô; o bezerrinho que a vovó deixou que eu cuidasse; as brincadeiras com meu irmão no jardim que ela cultivou com tanto amor e era o seu orgulho! Adorávamos brincar de labirinto entre as rosas, as cravinas e depois fugíamos pra horta, ao lado, onde estavam as couves, os alfaces e muito mais que acabava virando nossa refeição e que aprendemos a saborear com gosto.
|
Jardim da vovó |
Férias em São Lourenço do Sul significava ficar ROSADA. Nós ficávamos na casa desses avós com hábitos rígidos da sua cultura alemã, como jantar às 18hs, então aproveitar a praia, chamada Pérola da Lagoa - recomendo, é linda mesmo! - significava reunir os primos, que iam de Porto Alegre, com os de lá. E eu amava brincar com minhas primas! Mas significava também pegar o sol no momento mais perigoso e ficar de bode porque na hora mais bacana era o momento de ir jantar e não tinha negociação. Nunca entendi o motivo, mas foi assim.
|
Chegando da praia: banho de regador |
Não havia a cultura do filtro solar e me lembro da minha mãe usar nela, uma pessoa que se bronzeia até com suspiro, coca-cola e óleo bronzeador (odeio o cheiro até hoje) pra ficar pretinha e cheia de abelhas por perto. E eu, invariavelmente, embaixo das figueiras, mas conseguia ter insolações memoráveis. Calamina deu muito lucro comigo.
Mas nós tínhamos também um mundo a explorar que era maravilhoso. A casa do vovô Albino e da vovó Ilma era grande e tinha um armazém onde se encontrava de tudo: tecidos, linhas e aviamentos; lembrancinhas de batismo (oi?!); enxadas, sementes, ancinhos e regadores; pinga, vermute e conhaque; vegetais da horta, ovos colhidos no fundo de casa; manteiga que nem ia pra geladeira (ECAAA eu já dizia quando criança); penico de louça; remédios que ficavam ao nosso alcance e nós pegávamos NAFTALINA, ASPIRINA INFANTIL e AAS pra comparar o sabor com BALAS DE BANANA, PIRULITOS E BALAS SOFT; ki-suco e guaraná frisante Polar, guaraná Sielva, guaraná em pó... Também tinha toicinho, salame, queijo e mortadela "armazenados" em uma invenção do meu avô que não tenho como descrever agora, porque faltam as palavras (tô chorando de novo) e imagens pra ilustrar, mas volta e meia cercada por moscas. - Sentiram que sou uma entre muitos sobreviventes?
|
Dindo Guto, dessa vez atrás da mesa |
Mas também tive uma infância cheia de outras coisas, como brincar no quarteirão do condomínio onde meus pais vivem até hoje, numa época em que não havia cercas; a turma era grande, parece que o relógio biológico da mulherada estava sincronizado e todas resolveram parir os primeiros e segundos filhos juntas. Foi lá que conheci o meu cumpadre, o Dindo Guto. O meu amigo/irmão, que eu enfiava debaixo da mesa da sala e vivia com hematomas na testa porque eu adorava empurrar o carrinho de bebê dele, me aproveitando de ser 6 meses mais velha que ele. Essa amizade estava escrita, já que nossos pais são amigos de infância, vieram morar em POA e dividir apartamento, compraram juntos apartamento quando iam casar, na mesma época...
|
Casamento coletivo |
Com essa turma vivi grandes alegrias e a minha mãe, antenada que só, tinha umas idéias malucas pra época, como nos fotografar lá da janela do apartamento enquanto ficava de olho passando roupa, pra termos recordações. E encontrei uma foto de um dia em que brincávamos de casamento - e eu achando que a filha era precoce! - Tinha todo o cenário armado, com cobertores pra sentarmos na grama, as bicicletas para sairmos da cerimônia, as meninas mais velhas enfeitando os cachos da minha amiga Biba com jasmins, enquanto nos meus nada parava, porque eram muito lisos!
|
Folia organizada |
Outra invenção da dona Ciça foi a sacola com cordinha pra enviar o lanche pela janela do 4º andar pra que eu nem entrasse imunda no edifício, o que pra ela era um pecado - hoje entendo! - ainda mais que eu adorava me pintar de barro pra ficar pretinha como minha Dinda Janine e minhas primas de Dom Pedrito e do Rio de Janeiro.
Fora que todos os animais machucados iam parar lá em casa, tivemos marrecos dentro do apartamento e dávamos banho com água morna, pra depois secá-los com secador. Tivemos passarinhos em gaiola que não conseguimos ficar por muito tempo, de dó que eles ficassem tristes com a prisão que significava estar conosco. Hãmster, cachorros que foram parar lá em casa no meio de uma reunião dançante em uma sala de 10m² e ficaram menos de 15 minutos porque fizeram xixi e acabaram com a festa... enfim...
Nós tivemos oportunidade de dividir espaços, brinquedos (não ganhávamos muito nem a oferta era tanta quanto hoje) e o primeiro a ter videogame no condomínio foi o meu primo Xande, eu acho. Então ele organizava campeonatos de ATARI com caderneta pra conferir na tabela o andamento do concurso.
Tínhamos atritos e nhenhenhés como as meninas e meninos de hoje; tínhamos ciúmes e também vontades, mas nossas frustrações não iam longe, porque a galera se resolvia e muitos dos perrengues nem chegavam aos pais. Talvez nossas mães dessem mais espaço pra vivermos esses sentimentos, sem tentar psicologizar tudo, sei lá.
Os corredores dos prédios (são 3) eram cenários de muitas aventuras, como ter coragem de tocar a campainha do apartamento de uma senhora que até hoje me dá arrepios, porque quando se mudou pro bloco era viúva recente e vivia de preto... Logo sendo associada a uma bruxa. Nós quase rolávamos do 6º andar até o térreo embolados, porque o medo de ela nos pegar era imenso, mas a curiosidade por ver o caldeirão era igual!
|
Sentiram de quem eu sou fã? |
Tive chá de encontro das bonecas (pena não ter escaneado!), joguei taco (foi assim a primeira vez que torci o pé, de muitas), subi em árvores e nunca consegui descer, porque morro de medo de altura. Tive reuniões dançantes, dança da vassoura e aprendi a jogar cartas com a minha amiga Nanda, que junto com a Jana me levavam pra escola aos 5 anos, cuidando como irmãs mais velhas. A escola onde fiz a pré-escola era pública, ficava a 2 quarteirões e nós sentíamos segurança de andar pelo bairro.
Nossas mães nos levavam de ônibus (de galera) pra fazer piquenique em parques do outro lado da cidade e aos primeiros dias de passe livre, coisas bem doidas, porque toda a população portoalegrense tinha a mesma idéia no mesmo dia; tínhamos um verdadeiro Barney, o Remendão, como herói, que morava no sétimo andar e fomos ao seu programa. Tive exemplos péssimos de comportamento nos desenhos que amava assistir como Tom & Jerry, Pica-Pau, Pantera Cor-de-Rosa e Pernalonga. E acho que sei dizer as falas de tantas vezes que assisti. E até hoje eles são repetidos!
|
Meu bonecão nasceu em 1978 |
Mas talvez a melhor brincadeira de todas tenha sido me tornar a irmã mais velha. Achei que o nascimento do Max, que eu havia torcido muito pra que viesse uma Grace, não mudou a alegria com que vi a chegada de um bebê. Ele era o meu bonecão, lindo, com quem adorei dividir espaço, atenção e a vida. É o meu maior amigo, de todas as horas e com quem compartilho muito mais que o gosto musical. Nós temos uma infância bem vivida, adolescência idem. E a vida adulta nos uniu ainda mais.
|
Essas pessoas continuam amigas! |
Nesse sentido, sou saudosista: tive mais liberdade do que nossos filhos têm, mas ao mesmo tempo cresci vendo o mundo se desenvolver, progredir em várias coisas, então na mesma medida acredito que também não fiquei ancorada lá atrás. Talvez o que tenha acontecido seja que eu me sinta inspirada pela infância que tive pra tentar proporcionar um bocado de coisas aos meus filhos. A principal delas, brincar em espaços abertos ou em casa, porque acredito que "o brincar é necessário para a vida humana" (Tomás de Aquino).
Talvez por isso a criança que vive dentro de mim esteja chorando de alegria por ter esse baú de memórias, mas por não ter se perdido no meio do caminho e continuar me inspirando. E sorria pra você, que participou dessa blogagem, contando suas memórias para um montão de gente e que espero que volte aqui sempre que desejar, porque também aprendi na infância que é muito bom fazer novos amigos.
|
Primos: amigos para sempre |